sexta-feira, 30 de maio de 2014

Juliette Society & Sasha Grey


Juliette Society é um livro escrito pela atriz pornô Sasha Grey. Desde o ano passado fiquei sabendo que Sasha Grey esteve em São Paulo para o lançamento do livro, o que de fato, me deixou bem curioso para lê-lo. Conheço pouco o trabalho dela como atriz, apesar já ter visto algumas cenas dela, inclusive em filmes da Belladonna. É uma boa atriz e segue uma linha de atuação a lá Belladonna, o que me agrada bastante.

No início do ano li 50 tons de cinza e acho que por razões óbvias não dediquei nenhuma linha aqui no blog sobre o livro. Na época estava precisando de uma leitura light e acabei por dar uma espiada no que se tratava e para entender o motivo de tanto frenesi entre as mulheres. É interessante, às vezes, ler certas coisas apenas para saber como foram escritas. Acho que é como provar uma torta, apenas para decifrar quais ingredientes foram usados.

O enredo de Juliette Society me chamou um pouco a atenção, mas confesso que me soou clichê um pouco clichê, a coisa da sociedade secreta, o tema erótico e comercial. Nada muito original e, de fato, até arriscável. Escrever um livro/romance erótico pode parecer simples, mas se for fazer bem feito, não deve ser fácil. O fato de ser escrito por uma atriz pornô contribuiu para meu interesse. Sasha Grey não é nenhuma atriz de peso como Silvia Saint, mas também não é nenhuma múmia como uma Júlia Paes. Beleza, filmes eróticos/pornô e literatura são coisas que me interessam, ainda mais quando vem juntas. Ler uma autora nova, contemporânea, também era algo que me interessava. De vez em quando é bom deixar os clássicos, os cânones e ver o que os autores novos andam escrevendo.

Confesso que o livre me surpreendeu no início. Logo no início da trama uma mistura da sétima arte, pinceladas de erotismo de leve e um toque de perversão, passando por citações de pensadores interessantes. Nada profundo, mas sutil. A resenha do livro, quando li me fez lembrar dos filmes Belle de Jour e também de O Albergue. A descrição logo nos primeiros capítulos da personagem de Catherine Deneuve e o enredo do filme de Buñuel vão dando um caldo especial a leitura do livro de Sasha.

É interessante pensar em Sasha enquanto atriz pornô e ao mesmo tempo escritora. A indústria de filmes adultos gira em torno de muito preconceito. Preconceito por quem faz parte e por quem assiste ou financia. Não nego que exista o lado negro da indústria, pois ele existe. Mas existe sempre um perfil por trás de atrizes pornôs e prostitutas, construído socialmente, ou talvez por elas mesmas, de que esta é uma atividade passageira e que se trata apenas de dinheiro. E quando pensamos nisso, acho que acabamos por, "sem querer", observar estas atrizes como "coitadas", como alguém que não sabe fazer nada ou não deu certo em nada, e a única coisa que lhe resta é ser fodida para ganhar algum trocado. Sasha Grey se mostra como uma boa escritora, com um estilo interessante e alguém que se interessa por arte e literatura.

Enquanto a lia sentia uma certa curiosidade literária-erótica, se é que podemos utilizar este termo, de como ela iria construir o enredo erótico do livro. Veja bem, não estamos falando de uma menina ingênua, que está dando seus primeiros passos no campo erótico. Apesar da fama de vulgaridade que o pornô tem, pela vasta quantidade de filmes pornôs ruins e da grande contribuição da indústria brasileira (vide Brasileirinhas), Sasha Grey não tem nada de vulgar. Pelo contrário, transmite uma imagem de menina tímida e simpática. Quem conhece seus filmes sabe que ela faz uma linha hardcore e que sexo anal é fichinha pra ela. A questão é, como ser hardcore na literatura sem ser vulgar, assim como nos filme dela? O fato do filme ter mais recursos como áudio e visual, não o faz mais fácil de pescar o espectador do que um romance. Transmitir ao leitor também uma boa história sem os recursos dos filmes também pode ser um desafio.



Alguns filmes pornôs não fazem nenhum mistério quanto ao seu roteiro: sexo oral, vaginal e anal. É um fórmula que não surpreende muito, mas que pode ser feita infinitas vezes com atrizes diferentes, de maneiras diferentes e sob ângulos diferentes, proporcionando inclusive, uma fotografia diferente, cenários, roteiros, luzes, etc. Então, como surpreender um fâ da Sasha Grey, que curte seu estilo de atuação nas páginas de um romance em que há sobre a autora, talvez, uma certa pressão de fazer algo tão bom quanto seu trabalho ou superior?

Confesso que algumas descrições de cenas de sexo não me causaram nenhum tipo de excitação. Não a leio como se lêsse Anais Nïn ou o Marquês de Sade. Leio-a como telespectador de suas cenas e, sinceramente, isso tem um grande peso na leitura. Porém, ela se esforça para descrever com bastante entusiasmo cenas de sexo oral, mas o vínculo com a Sasha atriz emerge a todo instante.

Voltando a cena de sexo oral, quando algo parecia ter se tornado clichê, eis que algo acontece. Até porque não se trata de um conto erótico, com ritmo marcado e aquele timing que deve ou deveria ser cumprido, mas de um romance. E o que muitas vezes é interessante é o questionamento de certos comportamentos masculinos, visto como estúpidos, que a personagem aponta como reflexo de horas perdidas que muitos homens gastam vendo filmes pornô e achando que as mulheres deveriam se comportar daquela maneira. O fato da autora ser uma atriz pornô famosa faz com que isso soe interessante.

Em alguns momentos o livro descamba quase para uma auto-ajuda ou ego trips para leitoras adolescentes de best-sellers. Isso deixa a desejar em alguns momentos. O livro, enfim, é bem melhor que 50 Tons de Cinza, porém, é um livro raso. É um livro light para se quebrar uma rotina de leituras complexas, mas também é um livro obrigatório pra quem curte a atriz e goste de ler. No fundo, acredito que ela não tenha desejado escrever um livro estritamente erótico para ser comparada com um Sade da vida, mas algo em que ela pudesse costurar em cima de uma colcha de retalhos e mostrar que ela é muito mais que uma atriz pornô, o que de fato é.

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